
O país não se deve preocupar muito com o crescimento da população, mas deve focar-se na educação e na produção para conseguir controlar a economia.
A opinião é do economista e professor universitário José Chichava. Por seu turno, o economista Egas Daniel diz que o crescimento da dívida pública limita os investimentos do Estado em projectos sociais.
Cinquenta anos de gestão das finanças públicas e desenvolvimento local foi tema do debate organizado pelo Fórum de Monitoria do Orçamento, nesta quinta-feira, na Cidade de Maputo. Entre várias opiniões, o economista e professor universitário José Chichava mostrou desacordo com a ideia de que o país precisa de controlar o número de filhos por cada casal para controlar a economia.
“Não é necessário fazer uma gestão demográfica nenhuma. Caso contrário, qualquer dia, alguém vai dizer o seguinte: as pessoas têm de ter um filho ou não ter filhos. Não é por aí, essa não é a solução. A solução é a educação. Se educarmos as pessoas e as comunidades, por exemplo, as pessoas com o meu nível de educação já sabem o que significa ter três, quatro, cinco ou seis filhos sem que ninguém lhes diga. Elas próprias optam por ter menos filhos. Portanto, não é limitando a natalidade que vamos resolver o problema”, disse o economista, que falou igualmente da Estratégia Nacional de Desenvolvimento, que, no seu entender, “ela não pode planificar o desenvolvimento da economia sem considerar a população”.
Para Chichava, “o Governo deve focar-se primeiro na educação e depois na produção”.
Questionado sobre a situação actual da dívida pública, José Chichava diz que o crédito do Estado com os bancos comerciais prejudica o crescimento do sector privado.
“E por causa disso que nós temos um sector produtivo que não produz, porque os empresários, quando vão ao banco, têm dificuldades para obter financiamentos. O que acontece é que os montantes que deviam ser absorvidos para darmos crédito ao sector empresarial para poder criar mais postos de emprego, para poder produzir mais, são aqueles que o Estado usa para pagar salários da sociedade e para outras despesas”, explicou.
Aliás, o economista Egas Daniel aponta que o crescimento da dívida interna e a pressão de liquidez a curto prazo limitam a capacidade do Estado de promover melhores condições de vida ao povo moçambicano.
“O serviço da dívida, que são as prestações que o Estado tem de pagar, também entra na contabilização das despesas que o Estado deve efectuar naquele determinado ano. Isso significa que, para um determinado ano, se a dívida contraída nos anos anteriores implicar um maior serviço da dívida no presente ano, então os sectores prioritários, os sectores sociais vão ficar reprimidos. E são, talvez, os mais fáceis, ou pelo menos os que, supostamente, ao longo do tempo, vão sofrendo uma diminuição no seu aumento, porque parte do aumento da receita é canalizada para o pagamento do serviço da dívida”, elucidou e acrescentou que, em vez de aumentar os recursos para os sectores da educação, saúde, agricultura ou qualquer outro que seja considerado importante, uma parte significativa da receita é canalizada para o pagamento do serviço da dívida, suprimindo a relevância dos sectores sociais dentro do orçamento.
Com os problemas elencados, Egas Daniel aponta como saída o alinhamento da estratégia de gestão da dívida com a realidade macroeconómica, o cenário fiscal e as perspectivas económicas é essencial para garantir a sua execução. Estratégias demasiado otimistas tendem a não ser cumpridas. O não cumprimento também pode resultar da falta de coerência com outros instrumentos de planificação pública. Para uma melhor gestão da dívida, é importante limitar os riscos do sector empresarial do Estado e aprimorar a selecção de investimentos, especialmente os financiados por crédito externo
Egas Daniel termina apontando que “muitos projectos não passam por avaliações de viabilidade, como pode ser o caso do aeroporto de Chongoene”, o que levanta preocupações sobre a eficácia na utilização dos recursos fundos públicos provenientes da dívida.
SITUAÇÃO ACTUAL DA DÍVIDA PÚBLICA DE MOÇAMBIQUE (2025)
Nos últimos anos, a dívida pública de Moçambique tem crescido rapidamente. Em 2024, a dívida alcançou cerca de 74,2% do PIB, segundo o Governo, com expectativa de redução para 67,6 % em 2025 e 60,8% em 2029, como parte do Programa Quinquenal (PQG) 2025–2029. Porém, o risco fiscal permanece alto e a relação dívida/PIB pode subir a até 80,5% caso o crescimento económico não se concretize conforme o previsto .
O serviço da dívida (juros e amortizações) disparou, com previsão de aumento de 17,3% em 2025, totalizando cerca de 120,6 mil milhões de meticais, ou 7,8% do PIB, o que pressiona ainda mais o espaço orçamentário para investimentos sociais e de desenvolvimento. O documento orçamental admite que o serviço da dívida e a remuneração da função pública consomem aproximadamente 85% da receita tributária, evidenciando uma severa limitação ao orçamento estatal .
Em termos de stock de dívida, o país superou a cifra de 1 trilhão de meticais (cerca de 16,7 mil milhões de dólares) no primeiro trimestre de 2025, um aumento de 2,7% em relação ao trimestre anterior. A maior parte desse crescimento foi impulsionada pela dívida interna, que aumentou 8,9 % (~6,9 mil milhões de dólares), enquanto a dívida externa recuou ligeiramente, para 9,8 mil milhões de dólares.
A dependência de financiamento doméstico de curto prazo, especialmente por meio de Tesouro e empréstimos do banco central, é preocupante. Cerca de 41 % da dívida interna é de curto prazo, o que eleva os riscos de refinanciamento e pressiona o tesouro público. A agência S&P chegou a rebaixar o rating da dívida interna moçambicana para “Default Selectivo” (SD), devido a atrasos em pagamentos e reestruturação de títulos, ressaltando a fragilidade fiscal e a deterioração da confiança dos investidores.
Fonte O País